“Curadoria é um gesto de escuta. E toda escuta, quando comprometida com o presente, é também uma tomada de posição.”

Por que estes nomes?

Ciclo F.Li.Coimbra 2025 – Descolonização do Patrimônio Intelectual e Cultural

Ao conceber este ciclo, não busquei representar geografias, correntes literárias ou sistemas académicos. Busquei ouvir o que tem urgência. Ouvir quem escreve a partir de feridas abertas, de histórias não contadas, de línguas em disputa. Reunir estes nomes é afirmar que o patrimônio intelectual e cultural de nossos povos não pode mais ser herança passiva — precisa ser descolonizado, reescrito, reimaginado.

Sérgio de Castro Pinto, com sua poesia luminosa e telúrica, representa a sabedoria poética de um Nordeste que pensa o tempo como verbo e o território como corpo. Ao lado dele, Naná Garcez, jornalista e dirigente pública, encarna a potência de uma mulher que faz da palavra um instrumento de memória coletiva, como diretora-presidente da Empresa Paraibana de Comunicação.

Tom Farias, em múltiplas mesas, atua como fio crítico do ciclo: é o biógrafo das ausências, o pensador que restitui vozes apagadas, e por isso mesmo, presença essencial. Sua escrita reconecta a literatura com o seu dever histórico.

Marilia Arnaud, André Augustus Diasz, Juliana Maia e Lulih Rojanski formam uma constelação de resistência e invenção voltada à infância. Cada um deles oferece caminhos para pensar o livro como instrumento de cuidado, reencantamento e reconstrução simbólica. A infância, neste ciclo, é lugar de fronteira e de potência.

Marco Neves, linguista e ensaísta português, desestabiliza os mitos da língua como unidade. Yurgel Caldas, amazônida e crítico, propõe novas mitologias a partir do sul epistêmico da floresta. E Angélica Ferrarez, filósofa dos afetos insurgentes, amplia o campo ao incluir o corpo, o gênero e o afeto como chaves de leitura do mundo.

Germano Almeida e Joãozinho Gomes falam da oralidade como arquivo vivo. Um, com humor e ironia cabo-verdianos que o fizeram ganhar prémio Camões. O outro, com o ritmo e a espiritualidade das águas do Norte do Brasil. Em comum, têm o gesto de transformar o dito popular em gesto literário.

Alberto Santos, romancista e figura pública da cultura portuguesa, é aqui lido pela sua posição intelectual de escritor internacional preocupado com o impacto e a convivência de muitas culturas e hoje — também pelas funções que desempenha — uma das personalidades mais importantes da cultura portuguesa.

Por fim, há em mim, José Manuel Diogo, o desejo explícito de que este ciclo seja mais do que um programa: que seja um território. Um território onde se possa dizer o indizível. Ouvir o que não foi dito. E, acima de tudo, imaginar o que ainda não existe.

Porque a descolonização do patrimônio começa por reconhecer que o mundo não está pronto — ele está em escrita.

José Manuel Diogo

São Paulo, 16.06.25